terça-feira, 12 de março de 2013



Os cursos superiores de turismo no Brasil
Fonte: Jornal do BrasilBayard Do Coutto Boiteux*

Tenho andado muito preocupado com os rumos do ensino superior do turismo,em nosso país. Vejo, com tristeza  o fechamento de várias faculdades e a não formação de primeiro período, na maior parte das instituições de ensino. Hoje, quase 70% de todas as faculdades brasileiras têm menos de 200 alunos na área e acabam esquecendo os investimentos que deveriam ser feitos, já que priorizam cursos que conseguem viabilizá-las financeiramente. Resolvi então estudar o problema e passo a fazer algumas considerações.
Começaria pelo processo seletivo. Com a ânsia de ter cada vez mais alunos e deixando de lado a qualidade, faculdades particulares foram se distanciando de um verdadeiro vestibular. Assim, entram inúmeros alunos no ensino superior que não possuem perfil para cursar uma faculdade. Estariam mais voltados para cursos profissionalizantes, que o senso comum não entende a importância. Muitas pessoas vivem a ilusão de uma faculdade... Assim, acho que, se iniciarmos com uma nova forma de seleção, com entrevistas prévias com a coordenação de curso, esclarecimentos sobre o mercado de trabalho, suas opções, perfil almejado, estaríamos sendo mais justos e reais com aqueles que escolhem trabalhar no segmento.
Por outro lado, é preciso entender que um estudante de turismo, para ter sucesso precisa fazer investimentos. Eles começam na possibilidade de experiências internacionais, como intercâmbios, viagens ou seja percepção in loco de uma diversidade linguística, cultural e globalizada. Os idiomas são  fundamentais, e pelo menos o inglês deveria ser pré-requisito nas faculdades de turismo. O fato de as mesmas incluírem as chamadas línguas estrangeiras em suas grades não é suficiente. O que se propõe teoricamente é uma otimização do vocabulário técnico e não a fluência escrita e oral necessárias. Faz-se também imprescindível aprimoramento constante em cursos de extensão, participação em seminários e eventos especializados, além das grandes feiras. Hoje, vejo que alguns alunos não conseguem nem sequer custear as atividades complementares obrigatórias, como as visitas técnicas.
O curso demanda, em grande parte, uma cultura geral do aluno. Ela deve ser adquirida no ensino médio, na leitura diária de jornais, revistas e na curiosidade intelectual por tudo de novo que acontece diariamente na humanidade. Só assim teremos alguém capaz de entender a forma rápida como evolui o setor e que precisa ser acompanhada. História da Arte, Geografia, Psicologia, Direito, Historia da Cultura, administração, gestão financeirasão tão importantes quanto as disciplinas técnicas que atraem mais alguns alunos, que pensam em apenas entender práticas operacionais e não os grandes fundamentos que norteiam a atividade.
Penso sempre na importância do estágio, desde os primeiros períodos. O aluno vai poder vivenciar várias áreas e buscar a que mais lhe apraz, sem esquecer que todas acabam por interagir. Por isso, as faculdades devem também possuir laboratórios específicos, gerenciados por alunos sob supervisão docente. Eles permitem não só a prática mas que o mercado possa de alguma forma utilizar tais laboratórios para distribuição de seus produtos ou então fazer deles verdadeiras incubadoras.
A gestão acadêmica precisa de liberdade: pensar, colocar em prática novas tecnologias e principalmente conquistar espaços no empresariado, que deve estar presente diariamente nas instituições. Não só nas salas de aula, apesar de sua pouca titulação e produção acadêmica, via de regra mas em palestras, seminários, aulas inaugurais e assessorando os rumos que devem tomar aquelas faculdades que vão sobreviver e que serão poucas, penso eu. Um gestor não pode ser um seguidor de parâmetros educacionais criados, sem nenhuma autonomia. Não há evolução em  tais modelos e chega-se a gestores medíocres, que para sobreviverem acatam ordens, sem nenhum discernimento. Pessoalmente, não consigo trabalhar sem um mínimo  de liberdade na administração educacional.
A carreira docente deve passar por um processo de valorização. Temo que vários professores hoje ministrem aulas por não terem encontrado outras soluções de sobrevivência. São fracos, desmotivados e vivem de uma relação afetuosa com os alunos, por não possuírem aquilo que deveria ser melhor apreciado num mestre: o dom de dar aula, de compartilhar informações, de ser um exemplo na ética e não aquele que mais aprova. A escolha de muitos paraninfos e patronos se justifica para os alunos pela forma liberal como suas aulas foram ministradas. Um professor precisa estudar sempre, se atualizar e no caso do turismo, viajar, ler muito sobre cases de sucesso e utilizar o benchmarketing. Deve tanto sensibilizar o aluno com suas informações como fazer da sala de aula um espaço  democrático de percepções e entendimentos diversos.
Finalmente, o aluno precisa ser melhor orientado. Hoje, muitos questionam em redes sociais práticas dos cursos por não saberem o que é estudar numa faculdade, como se comporta um coordenador, como deve agir um aluno que estuda numa faculdade. Por pouco conhecimento, repetem o mesmo discurso de que ”são clientes e merecem respeito”, ou seja, fizeram do ensino uma relação mercadológica. Só atentam para aspectos materiais. São incapazes de fazer manifestações para regulamentação da profissão ou ainda exigirem professores efetivamente comprometidos com o saber necessário, para uma sociedade que não vive só de técnicas operacionais. Volto a afirmar que como alguns fazem parte de uma primeira leva familiar que entrou na faculdade ou são empurrados para os bancos escolares pelos pais que acham que a faculdade vai proporcionar sozinha um novo cidadão. Não, não mesmo. As famílias são fundamentais no acompanhamento de SEUS filhos, buletins, seus posts em redes sociais, entre outros.
A verdade é que ando preocupado com faculdades que só inscrevem parte dos alunos no Enade e se apresentam em anúncios como as melhores do país, com os salários pagos em alguns segmentos da atividade turística e pela falta de criatividade do setor, que deve se apoiar na “academia”, para novas descobertas comerciais. Não sei quanto tempo vou permanecer como gestor (hoje completei 30 anos de coordenação de curso), mas queria, sinceramente, mudanças drásticas, pois acredito no bacharelado em turismo e no turismólogo.
* Bayard Do Coutto Boiteux, professor universitário, é escritor,pesquisador e preside o Site Consultoria em Turismo. - www.bayardboiteux.com.br

Nenhum comentário: